Hoje não estou para ninguém...

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Saí cedo, mas a tarde caía já nos braços da noite. Continuo a resistir à ideia de que o escuro se impõe cada vez mais cedo e que o frio se entranha de forma subtil. A cidade acende-se e eu sigo a fila de luzes que me leva a casa. Entro e sento-me no silêncio. Preciso de estar comigo. Sinto-me a perder-me de mim própria, sem conseguir juntar todas as peças. Paradoxos, contradições, dissonâncias que me diluem e que não me deixam perceber quem sou ou o que quero. Preciso sair de cena para entrar no ritmo...
Ouço várias vezes "não penses" ou "pensas demais". Não ligo. Não ambiciono passar pela vida como um rio, sem questionar, sem decidir que rumo tomar. Nem quero verdades absolutas, não acredito nelas. Para mim quem nunca está confuso corre o risco de andar enganado. O telefone toca. Não. Não é a hora.

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"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo."
Clarice Lispector

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